A eleição ilegítima de Merval Pereira para a ABL
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A eleição ilegítima de Merval Pereira para a ABL

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Os abaixo-assinados solicitam à Academia Brasileira de Letras a anulação da eleição realizada em 2 de junho de 2011, que resultou na escolha do jornalista Merval Pereira para suceder ao imortal Moacyr Scliar, último ocupante da cadeira de número 31. O pedido baseia-se no flagrante desrespeito ao segundo artigo do estatuto da própria Academia.

"Art. 2º - Só podem ser membros efetivos da Academia os brasileiros que tenham, em qualquer dos gêneros de literatura, publicado obras de reconhecido mérito ou, fora desses gêneros, livro de valor literário."

http://www.academia.org.br/abl/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=5

Segundo a própria ABL informa em texto do seu site, o jornalista Merval Pereira publicou somente dois livros em sua longa carreira. O primeiro deles:

"Em 1979 recebeu o Prêmio Esso pela série de reportagens 'A segundaguerra, sucessão de Geisel', publicada no Jornal de Brasília e escrita emparceria com o então editor do jornal André Gustavo Stumpf. A série virou livrocom o mesmo nome, editado pela Brasiliense, considerado referência paraestudos da época e citado por brazilianistas, como Thomas Skidmore."

http://www.academia.org.br/abl/media/Merval%20Pereira.pdf

Assim, a primeira das duas únicas obras publicadas pelo jornalista Merval Pereira é uma edição em livro de uma série de reportagens. E não se trata de um livro de autor, mas de um parceria, a de um repórter com o seu então editor, situação em que não se pode determinar objetivamente o que é de um escritor e o que é do outro (embora se suspeite que o mérito maior caiba ao editor, como é de costume nesses casos).

Portanto, a despeito do elogio feito ao livro no texto da ABL ("considerado referência para estudos da época e citado por brazilianistas [sic – 'brasilianistas', segundo o 'Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa', da própria ABL], como Thomas Skidmore"), não se pode considerar "A segunda guerra" como uma "obra" na acepção pretendida pelo segundo artigo do estatuto, porque, logicamente, a avaliação do "reconhecido mérito" resta prejudicada neste caso.

Na mesma página da ABL, o texto registra outras participações do jornalista Merval Pereira em livros: artigos inéditos e colunas republicadas em coletâneas de vários autores, apresentações, prefácio e conto. Nenhum livro de sua própria autoria, a não ser "O Lulismo no Poder", lançado em 2010 já com vistas à eleição para acadêmico.

Bastaria esse fato para eliminar a própria possibilidade de participação do jornalista Merval Pereira na disputa pela cadeira 31 da ABL. O estatuto é claro ao se referir a obras de reconhecido mérito (repetindo: "obras", no plural). Ou seja, os acadêmicos deveriam poder estabelecer o mérito do candidato, com precisão e sem possibilidade de erro, lendo obras de sua autoria. Mas o referido jornalista só possui um livro de autoria própria.

E, obviamente, nem se consideraria, no caso de "O Lulismo no Poder", a hipótese do lançamento de sua candidatura para aproveitar a alternativa relativa a "livro de valor literário" (note-se o singular), referida no segundo artigo.

Para eliminar essa possibilidade bastaria uma rápida análise de partes do prefácio escrito pelo próprio autor (itálicos acrescentados à transcrição):

. Metáforas infelizes (para dizer pouco):

"... o desenho do que seria o governo Lula desde os primeiros movimentos foiriscado com tintas mais leves no primeiro mandato, e com pinceladasmais fortes no segundo."

. Escolhas impróprias de termos:

" 'Esse é o meu cara', disse Obama em cena espalhada pelo mundo."

. Locuções verbais deselegantes:

"Da mesma forma, no plano internacional, Lula conseguiu convencero Primeiro Mundo de que era o único a poder controlar os líderesesquerdistas autoritários, quase ditatoriais, que foram sendo eleitos naAmérica Latina..."

"Quando se afirma como o principal líder de esquerda, para chegarà Presidência em 2002 teve que fazer o mesmo movimento para acentro-direita que já fora feito pelo PSDB, e acaba indo para o interior dopaís, tornando-se hegemônico no Nordeste."

Repare na, digamos, instabilidade dos tempos verbais.

. Repetições que revelam descuido estilístico:

"Embora já tenha dito mais de uma vez que nunca foi comunista,e que quem tem mais de 40 anos e continua sendo de esquerda tem problemasna cabeça, Lula tem uma formação de esquerda ..."

. Ambiguidade na indicação dos referentes:

"O lulismo passou a ser uma força política baseada nos programasassistencialistas, na classe média ascendente e no carisma de Lula,que passou a ter o PT apenas como instrumento de sua vontade."

Não o carisma de Lula, mas o próprio Lula. A propósito, teria sentido o lulismo basear-se no "carisma de José Serra"? Um bom redator evitaria a redundância.

Note-se o erro de informação: não se trata de "classe média ascendente", mas de "ascensão de 30 milhões de brasileiros à classe média".

. Denominações impróprias:

"... e ao mesmo tempo, com programas sociais assistencialistas comoo Bolsa Família e o aumento do salário mínimo, deu-lhes a impressão deque pela primeira vez alguém olhava por eles."

Considerar o aumento do salário mínimo como exemplo da categoria "programa social assistencialista" não revela exatamente um raciocínio límpido e preciso.

Ou seria mais um caso de ambiguidade, causada pelo plural?

. Aliterações desagradáveis:

"A Lula interessa manter essa dicotomia, desde que seja ele o eloentre os dois lados, ..."

. O famoso "trenzinho de quês":

"O mesmo Ministério da Cultura que apresentou em 2003um projeto que foi considerado pelo cineasta Cacá Diegues uma manifestaçãostalinista oferece uma nova versão da Lei Rouanet, que tem o mesmoobjetivo de direcionar os espetáculos culturais para 'compromissossociais'que o governo considere adequados ao que imagina para o futurodo país."

Segue o trem:

"Conhecido pela má vontade que tem com a preservação dos bagrese das rãs, que muitas vezes interferem nas grandes obras que sonhaconstruir, Lula..."

. Parágrafos que não seriam aceitos sequer numa redação do ensino fundamental, como este:

"O Lula hoje entrando no seu último ano de mandato expandidoé um político em permanente ascensão popular, com uma votação que vaimudando territorialmente ao longo do tempo, até se transformar no principallíder da esquerda brasileira."

"Mandato expandido" em vez de "segundo mandato";

"Permanente ascensão popular" em vez de "contínua ascensão popular" (não há 100% de aprovação que resista a uma ascensão "permanente");

"Votação", para um presidente em segundo mandato?;

"Mudando territorialmente" de onde para onde –- do Brasil para a Argentina, por exemplo?;

"Até se transformar" –- locução que não combina, em termos temporais, com o princípio "O Lula hoje...": ele já é esse líder, ou ainda o será?

Note-se que esse erro de construção é comum no estilo do jornalista:

"O aparelhamento do Estado, que define a visão de Estado forte do governoLula, vem (sic) se impondo de maneira crescente até se transformar em umadas bases de sustentação de sua política interna depois da crise financeirainternacional de 2008."

. Parágrafos sem unidade, construídos à base de palavra-puxa-palavra:

"Especialmente sob a orientação de Frei Betto, que viria a ser seuassessor especial no Palácio do Planalto, deixando o governo desiludido (sic)com os rumos tomados pelo que deveria ser o programa estruturalmentetransformador do governo Lula, o Fome Zero, substituído pelo Bolsa Família,de cunho acentuadamente assistencialista, sem grandes preocupaçõescom mudanças estruturais da sociedade."

. Barbaridades lógicas, como as autocontradições óbvias, não percebidas pelo próprio autor por causa do afã na enumeração de críticas a seu alvo político predileto:

"Suas políticas de transferência de rendas (sic), embora não tenhamalterado estruturalmente a sociedade brasileira, tiraram milhões de cidadãosda miséria e fortaleceram a classe média, que passou a incluir amaioria da população."

Como alguém consegue mudar a estrutura das classes sociais sem mudar estruturalmente a sociedade é um mistério que não foi explicado nas colunas do livro.

Pior. Mais adiante, o jornalista afirma sobre o programa efetivamente responsável por essa mudança estrutural:

"... [o] Bolsa Família, de cunho acentuadamente assistencialista, sem grandes preocupações com mudanças estruturais da sociedade."

. Afirmações que beiram o ridículo:

"Conhecido pela má vontade que tem com a preservação dos bagrese das rãs, que muitas vezes interferem nas grandes obras que sonhaconstruir, Lula ..."

. "Explicações" desprovidas de qualquer valor intelectual ou científico:

"... a ajuda do destino, quase um pleonasmo em se tratando da sua carreira".

. Análises políticas de um simplismo espantoso:

"Já se disse que o líder populista se diferencia do estadista porqueo primeiro pensa na próxima eleição, enquanto o outro pensa na próximageração. Lula é um político do primeiro tipo, tem uma visão de curtoprazo que supera suas preocupações com o futuro, exceto quando se tratade si mesmo."

Ou seja, o presidente que, pela primeira vez, fez do "país do futuro" um país do presente, na visão da mídia internacional, é justamente aquele que tem "visão de curto prazo" e que não "pensa na próxima geração".

. Erros profissionais ressaltados pelo próprio jornalista, conhecido por suas previsões que não abandonam a esfera da imaginação pessoal –- não exatamente um exemplo de "reconhecido mérito" profissional:

"A seleção de colunas não pretende ser um trabalho de historiador,mas um registro a quente da história em tempo real, um trabalhojornalístico que muitas vezes peca pelo registro apressado dos acontecimentosou pelas previsões que não se concretizam."

Mais: "...deixei no livro colunas que anteciparam situações que não se concretizaram e análises que não se confirmaram."

http://www.imil.org.br/wp-content/uploads/2010/10/Introdu%C3%A7%C3%A3o-Do-petismo-ao-Lulismo.pdf

Mérito, por favor.

Os fatos descritos acima provam que a eleição do jornalista Merval Pereira para a cadeira 31 da Academia Brasileira de Letras deu-se em total desacordo com o segundo artigo do estatuto da instituição. A decisão, portanto, não deve ser referendada pela Academia, sob pena de suspeita de favorecimento a um dos candidatos.

Caso a ABL decida manter o resultado da votação, a instituição fica, desde já, obrigada a vir a público e esclarecer qual é a utilidade real do segundo artigo do seu estatuto, ou então em que pontos do único livro atribuído exclusivamente a Merval Pereira se encontra o "valor literário" exigido por aquele artigo como pré-requisito para a participação do candidato.

Os abaixo-assinados também solicitam à Academia Brasileira de Letras o estabelecimento da proibição de candidaturas de não-escritores que tenham lançado um livro somente para concorrerem a uma cadeira na ABL, deixando claro aos pretendentes que o segundo artigo do estatuto refere-se a "obras", e não apenas a uma obra individual.

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